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sexta-feira, 18 de maio de 2018

Aula de Informática - 42


Rosinha tem dificuldades acrescidas a outras tantas. Esteve muito tempo ausente e já nem se lembra de como ligar o computador da sala de informática. Mas com um pouco de ajuda para reavivar a memória a coisa vai. Olinda já liga o computador com facilidade mas mais uma vez reclama porque a palavra passa não é aceite. Digo-lhe para introduzir novamente mas o computador não aceita. Digo-lhe que está errada mas ela diz que não, que não está errada e que tem acerteza que é aquela. Mas o computador não aceita e ela fica bloqueada. Rosinha, entretanto, já tem o computador ligado e puxa-me pelo braço para lhe dizer como é que entra no mail. Depois de entrar na página esbarra no mesmo problema de sempre. Não se lembra do seu próprio endereço electrónico e não trouxe os apontamentos. Vai ligar para a filha para lhe resolver o problema.

Entretanto, António, o professor de informática, foi até Olinda que continuava em apuros ainda por causa da dificuldade da palavra passe que não entrava. Claro, estava errada, mas o professor conseguiu a proeza de mais uma vez a recuperar. E o senhor João? Ah, o sr. João, com a sua voz baixinha que mal se ouve, diz-me que hoje quer fazer um mapa de despesas no excel. Pergunto-lhe se sabe trabalhar no excel, responde que já soube. Bom, se já soube já é alguma coisa. Vamos a isso. E começo a dar-lhe umas explicações de como funciona uma folha de cálculo. Fica radiante com as facilidades que o programa oferece. Quase em segredo diz “é isso mesmo que eu quero”. Excelente, estamos no caminho certo.

E Martim? Ah, Martim é uma graça. Um fofo! Um menino de setenta anos. Martim chama por mim desde que se sentou, mas eu ainda não tinha conseguido lá chegar. Finalmente aproximo-me dele, que está sempre em aflições, mas não deixa de sorrir. Martim quer enviar um mail para a filha, com um anexo, mas não sabe como. Não sabe nada. Desde a semana anterior já não se lembra como é que faz para chegar à página dos emails. Todas as semanas ele começa sempre do início, porque diz que já se esqueceu. Ele traz sempre o seu PC para ser mais fácil treinar em casa. Martim é alto, é grande, de olhos azuis e cabelos claros, é um menino em ponto grande. Emagraceu uns bons quilos, como se pode ver pela forma do seu corpo. Continua bem cheio mas tem tudo pendurado. São as bochechas, é a barriga, está tudo pendurado, mas é um bem disposto, excepto quando a aula não corre como ele quer.

Foi à internet e escolheu algumas imagens que quer guardar para pintar na aula de Pintura. Então pede para lhe explicar como é que envia uma daquelas imagens para a filha, que depois tira fotocópia para ele reproduzir. Digo-lhe para compor um mail, mas ele diz que não sabe como é que isso se faz, como se não o tivesse feito já dezenas de vezes. Mas tudo bem. Digo-lhe que leia o que tem na sua frente e veja onde se diz “compor” mas, Martim, desanimado, diz “não sei” e olha para mim com um ar de desolado, como se estivesse completamente desprezado. Agarra-me no braço e exige que me sente ao pé dele. Pronto, faço-lhe a vontade, porque também não há alternativa. O professor não chega para as encomendas, portanto fico a ajudar Martim. E com as minhas dicas, consegue chegar onde quer, embora reclamando sempre que aquilo é muito difícil. Deixo-o entregue ao texto enquanto vou espreitar o Cid.

Cid é um senhor de mais de setenta anos, de baixa estatura e magro. A sua forma de falar é sempre na base da filosofia, filosofia muito própria dele. De modo que, quando lhe perguntei se estava com algum problema, até tive que me sentar para o ouvir, porque o tempo que ele demora a digerir e a engendrar a filosofia adequada à minha pergunta leva tempo, tanto tempo que me obriga a sentar, senão, ai das minhas costas por estar tempo demais dobrada. E depois de responder, a resposta abrange tudo o que se possa imaginar menos responder à minha questão. Assim, pela segunda vez lhe faço a mesma pergunta e antes que venha outra resposta evasiva vou-lhe dando indicações para ir trabalhando. E no final das contas também não sabe a palavra passe. Deixo-o a pensar enquanto volto para Martim que já está novamente com o ar mais abandonado deste mundo. Entretanto, o professor está na outra ponta com o Joaquim, a Pilar, a Carolina que quer saber coisas do Face Book, etc…

Vamos para o Martim para o tentar acalmar. Martim quer enviar o anexo mas não sabe como. Digo-lhe sempre a mesma coisa: o que é que se faz quando se quer anexar um documento? Pega-se num “clip” não é? Ah, é verdade, diz ele, já sei e aponta com o cursor. Clica e abre a caixa de texto do arquivo. E agora(?), pergunta ele. Então, agora tem que ir procurar o seu anexo, digo-lhe eu, mas Martim já não sabe onde está. Nem nunca soube, porque guardou sabe-se lá onde!? Com toda a paciência do mundo lá vou eu intervir para tentar encontrar o que ele pretende. Mas o anexo que Martim quer não aparece e fica muito triste, muito infeliz, tal qual uma criança que não encontra o brinquedo que procura.

Martim é um indivíduo inteligente e bem sucedido na vida. Contudo, não teve experiência no campo da informática. Por isso, está agora a dar os primeiros passos. E cada passo que dá é para ele um passo gigante, fazendo-o ficar muito feliz com o que consegue. É por isso que é muito importante ajudá-lo e não só a ele, mas a todos os que nos procuram para esta iniciativa.

A minha paciência redobra. Digo a Martim para voltar atrás à procura do anexo e o guardar no ambiente de trabalho que é o sítio mais fácil para depois o encontrar. Martim vai então novamente ao google buscar uma vez mais o anexo e agora então guarda-o definitivamente onde lhe disse para o guardar e volta a fazer um mail para agora sim, anexar o que pretende, até que, enfim, a pintura lá seguiu o seu destino.

Mas Martim quer ter a certeza de que aquilo seguiu. Digo-lhe para olhar um pouco para cima e ler o que lá está: “a sua mensagem foi enviada, para vizualisar clique aqui”. E Martim clica. Mas, ai… o que foi que aconteceu? Martim não está nada satisfeito, nem um pouco, só falta chorar. É que o anexo não foi direito, diz ele, ficou com a ponta dobrada. Como? Não foi direito(?), perguntei. Sim, diz Martim apontando para o ecran, exactamente para o canto inferior direito do anexo: “Não vê que ficou com a ponta dobrada?”… (!?...)